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Um dia de um professor de três bandeiras

Um dia de um professor de três bandeiras

Professor Paulo Fernandes. Imagem Tatoli/Francisco Sony.

DÍLI, 05 de outubro de 2022 (TATOLI) – “Para que serve o ponto de interrogação? O ponto de interrogação serve para fazer uma pergunta”, explicou o professor Paulo Fernandes, de 66 anos, aos alunos do 5.º ano, numa sala de aula da Escola Básica Filial (EBF) Taur Matan Ruak, em Lahane Ocidental, Díli.

Paulo Fernandes nasceu em Ainaro, a 30 de julho de 1955. Vive na aldeia de Kare-Laran, do suco de Lahane Ocidental, do posto administrativo de Vera Cruz, do município de Díli. É professor desde 1972.

Tirou o primeiro ano do Ensino Pré-Secundário no Externato de São José, na capital.  Casou-se com Maria Assis Soares, também professora. O casal tem dez filhos: três já faleceram, cinco estão casados e dois solteiros. São avós de 15 netos. Começou por ensinar ciências-naturais, em 2008, na EBF Taur Matan Ruak, atualmente é professor de turma e ensina todas as disciplinas do 5.º ano de escolaridade.

No “tempo português”, o docente conta que concorreu a vagas para o ensino público e só depois se candidatou ao exame de admissão ao curso de formação de professores no Liceu Francisco Machado.

“Assumi a profissão com 18 anos”, declarou com orgulho. “Naquela altura, trabalhava em Aileu e ensinei na Escola Básica do Posto Escolar n.º 07, durante dois anos. Depois da Revolução de Abril, fomos obrigados a parar o serviço”.

Durante este período conturbado, o Conselho de Aileu escolheu-o para integrar o júri visando avaliar os exames finais dos estudantes do ensino do posto escolar, no suco de Sarlala, durante uma semana.

Paulo Fernandes recordou que durante o período colonial português, os professores eram mais rigorosos a ensinar os alunos, “mas agora é proibido bater neles”, adverte.

“Naquela altura batíamos nos alunos para eles aprenderem, mas agora já não. Por isso, agora é mais difícil os alunos compreenderem. Lembro-me sempre que, no ensino do português, o tempo de antes não é o mesmo agora, porque, no tempo do colonialismo, os professores ainda batiam nos alunos, mas atualmente é proibido pelo Ministério da Educação, Juventude e Desporto”, diz o professor, com um sorriso.

No período da invasão, o docente tentou procurar trabalho noutras áreas. No entanto, “tive a sorte de passar num exame para professor”. Detalhou: “Em 1980, senti-me muito feliz, porque o Ministério da Educação anunciou que os antigos professores de português podiam-se candidatar a profissão.  Apresentei a minha candidatura e passei a ser um professor na escola básica em Balibar, em Aileu. Naquela altura, recebia mensalmente apenas 15 dólares, o equivalente a 150 rupias”, conta, virando a cara e limpando o suor da face.

Em 1990, concluiu o Curso de Formação de Professores no Liceu, em Díli. A formação pretendia melhorar as competências em língua indonésia e noutras disciplinas.  Ele teve dificuldades, mas, praticando com indonésios, conseguiu aprender o bahasa.

Paulo Fernandes informa que, em 1991, transferiu-se para a EBF, em Saré, do posto administrativo de Hatulia, em Ermera, mas trabalhou apenas alguns meses. Nessa altura, Xanana Gusmão foi capturado num abrigo de uma residência privada, em Lahane. Esta residência era da prima do professor Paulo e nela também morava o seu filho. Este último, preso também, motivou o regresso do professor Paulo a Díli.

“Cada professor tem o seu método. Antigamente, tinha o meu próprio método de ensino para as crianças conseguirem escrever e ler. Para mim, é importante que os alunos saibam ler, escrever e contar”, lembra.

Com os resultados da consulta popular e o período de vigência da UNTAET, o sonho de Paulo Fernandes não morreu. Voltou a ser professor voluntário na EBF de Paiol, em Lahane Ocidental.

“Em 2000, o Ministério da Educação abriu vagas para os professores. A minha mulher e eu fizemos um exame. Conseguimos passar. Iniciei funções na EBF do Paiol, mas trabalhei apenas um ano. Decidi mudar, em 2001, para a EBF de Casait, em Liquiçá”, conta com orgulho.

Paulo Fernandes diz, em 2004, decidiu mudar para a EBF da Fahiten, em Liquiçá, porque a sua esposa trabalhava lá. Exerceu funções naquela escola até 2008.

Após a independência, todos os professores foram obrigados a frequentar uma formação intensiva. O entrevistado disse que gosta muito da língua portuguesa, porque quando era criança, os seus pais obrigavam todos os filhos a falar português.

A história do professor Paulo Fernandes e o seu espírito de missão são um bom exemplo para evocar o Dia Mundial do Professor que se celebra hoje, 05 de outubro. Foi neste dia, em 1966, que foi aprovada a Recomendação da UNESCO e da Organização Internacional do Trabalho, relativa ao estatuto do pessoal docente.

A celebração visa, entre outros, mas principalmente, sensibilizar para a necessidade de obter bons resultados no ensino, que não se alcançam sem fatores como a motivação, a formação contínua, o progresso na carreira e uma adequada remuneração aos professores.

“Não esperava ser professor. Quando era criança, estudava em Aileu. O meu professor batia-me com chicote até sangrar da cabeça e, por isso, sonhei ser um professor diferente. Neste momento, sou um professor de três bandeiras – de Portugal, da Indonésia e de Timor-Leste. Amo a minha profissão”, contou, numa expressão óbvia de satisfação.

E como seria bom se todos os professores se referissem à sua atividade com satisfação…

Jornalista: Isaura Lemos de Deus

Editora: Maria Auxiliadora

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2 Comments

  1. Um homem da minha idade que comecou quando eu fui professor de posto eventual em 1974. O Paulo deve-se lembrar que no tempo portugues, nas ferias grandes, no colegio das madres em Balide, havia o curso de reciclagem de monitores e professores de posto do governo e da igreja, os chamados mestres.
    Ainda me lembro do mestre Quintao e mestre Cruz(companheiro meu no cativeiro em Atambua) 1975-76.
    Lembra-se do inspector Barros Pereira e inspector Matoso? Da inspectora D. Cesaltina dos Reis da Silva Anes e do subdirector escolar Manuel Antonio Caldeira Baptista?
    Feliz dia do Professor Paulo!

  2. Caro Paulo!
    Naquele tempo havia 3 metodos de aprendizagem;
    A Cartilha
    A Tabuada
    A Reguada
    Aprendia-se muito depressa, num lalaise.
    Abraco

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