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Nanismo: “o país está a um passo de entrar na linha vermelha”

Nanismo: “o país está a um passo de entrar na linha vermelha”

Diretor-Executivo, Filipe Costa (à direita) e entrevistador Cancio Ximenes.

DÍLI, 09 de agosto de 2023 (TATOLI) – A Unidade de Missão de Combate ao Nanismo (UMCN) grupo, do tipo task-force, foi criado para apoiar atividades de tratamento e mitigação dos efeitos do nanismo infantil, bem como informar e esclarecer os cidadãos sobre as causas e consequências daquela condição médica, de modo a sensibilizá-los para a adoção de comportamentos preventivos.

A UNMC, que iniciou em março deste ano as suas atividades, está incumbida, entre outros, de elaborar o Plano Nacional de Combate ao Nanismo, implementar as medidas nele previstas, divulgar informação e esclarecer a população sobre as causas e consequências do nanismo, alertar para a adoção de comportamentos preventivos e apoiar as atividades de combate e mitigação do problema. Entre as missões fundamentais da unidade tutelada pelo Gabinete do Primeiro-Ministro, estão o combate ao atraso de crescimento infantil e a promoção da saúde e do bem-estar das crianças no país.

Considerando a gravidade do problema do nanismo e, subsequentemente, a importância do papel da UMCN no combate à doença, entrevistamos o Diretor-Executivo, Filipe Costa.

Qual é o papel da UMCN em Timor-Leste?

A UMCN deve preparar os planos nacionais de combate ao nanismo, organizar campanhas de sensibilização para que a população tenha conhecimento das consequências desta doença e coordenar-se com instituições relevantes na criação de estratégias que conduzam à sua erradicação no país. Como a agência foi criada em março deste ano, ainda não se registam resultados significativos. Contudo,  já foi entregue ao Conselho de Ministros o plano nacional consolidado, que já está a ser implementado por algumas das instituições relevantes. Elaborado com base em consultas feitas a nível nacional, esse plano define as prioridades no combate à má nutrição e apresenta estratégias que contribuem para garantir a segurança alimentar no país.

Atualmente, a UMCN está também a trabalhar na reformulação do plano integrado e já selecionou uma unidade que tem como primeira tarefa  reorganizar todas as agências, parceiros e Governo para o efeito. O processo está em andamento e esperamos que, ainda este mês, possamos começar a fazer consultas para se redefinir o plano de combate ao nanismo.

A equipa produziu também um manual sobre como melhorar a dieta alimentar em Timor-Leste. Os documentos já estão a ser usados pelo Governo e pela agência que monitoriza a implementação dos programas. Pretendemos trabalhar com os ministérios relevantes e com o Parlamento para que a UMCN  tenha o seu próprio orçamento. Espero que o orçamento retificativo contemple um fundo para a UMCN para que esta possa levar a cabo as suas atividades dentro de três a quatro meses.

“46% dos habitantes no país ainda não têm acesso a água canalizada” e 22% dos cidadãos timorenses vivem abaixo do limiar da pobreza”

O que é que a UMCN está a fazer concretamente para combater o nanismo

Vamos enviar os programas prioritários que já foram definidos pelos ministérios relevantes, para serem avaliados e, em função disso, serem orçamentados. Por exemplo, na educação, o programa foca-se na merenda escolar. Sabemos que o orçamento para a merenda escolar já subiu para cerca de 40 centavos, mas o nosso objetivo é garantir que as crianças em idade escolar possam consumir alimentos nutritivos. Na agricultura, temos de ser capazes de produzir alimentos suficientes e acessíveis para todas as pessoas. Para isso, trabalhamos com o Ministério da Agricultura para aumentar o volume da produção local, melhorar o armazenamento e os meios de transporte a fim de aperfeiçoar a distribuição. Também pretendemos garantir que os alimentos vendidos nos mercados sejam nutritivos e protegidos. Nesta questão, o Ministro do Turismo e Comércio vai ser  nosso colaborador. Em primeiro lugar, devemos ter uma lei sobre a fortificação dos alimentos, dotando-os de um valor vitamínico maior. Já preparámos um decreto-lei, mas não foi aprovado pelo anterior Governo, porque o mandato terminou. Esperamos que este ano possa ser apreciado e aprovado.

Satisfaz-nos constatar que a lei sobre os suplementos artificiais ao aleitamento materno pode regular a comercialização dos substitutos do leite materno. Além disso, precisamos também de uma lei sobre a segurança alimentar.

Convém dizer que atualmente o país é membro do CODEX alimentar (código de conduta internacional), o que implica implementar os regulamentos relacionados com a segurança alimentar.

Relativamente às infraestruturas, queremos trabalhar para que toda a população tenha acesso ao saneamento básico, porque atualmente 46% dos habitantes no país ainda não têm acesso a água canalizada. Apenas 36% da população tem acesso a um sistema de abastecimento de água potável. Também procuramos consciencializar os cidadãos, incluindo os próprios media, para nos ajudar na divulgação das informações sobre o perigo e as consequências de uma má nutrição e do consequente nanismo.

Pode explicar-nos o conteúdo da lei que mencionou sobre fortificação alimentar?

Recomendamos às instituições relevantes para avaliarem a qualidade dos produtos alimentares do ponto de vista nutricional, antes de permitirem a sua circulação no país. Por exemplo, o óleo e o arroz têm de conter vitaminas, o sal tem de ter iodo. Por isso, é importante avançarmos com uma lei sobre a fortificação alimentar para que a nossa deficiência estrutural de micronutrientes possa desaparecer ou ser mitigada. Focar-nos-emos só na obesidade e no nanismo. Segundo resultados de um inquérito do Programa Alimentar Mundial, cada família, se pensarmos num agregado familiar tradicionalmente numeroso, precisa de cerca de 15 dólares por dia para se alimentar nutritivamente. Todavia, dados apontam para um rendimento diário de apenas 1.90 dólares, isto é, aquilo que se define como sendo abaixo do limiar da pobreza. Os dados mostram que 22% dos cidadãos timorenses vivem abaixo daquele limiar.

“Atualmente Timor-Leste regista cerca de 41% de casos de nanismo”

Dispõe de mais dados que espelhem a realidade da má nutrição em Timor-Leste?

Sim. Segundo um relatório da UNDP, a percentagem da pobreza multidimensional é de cerca de 48%. Esta percentagem resulta da aferição de dez indicadores. Entre eles, dois estão relacionados com a saúde, dois com a educação e seis com o estilo de vida.

No que toca à saúde, a taxa de mortalidade puerperal atinge valores preocupantes. A esta acresce  uma má nutrição elevada, enquanto, no que toca à educação escolar, muitas crianças não frequentam a escola e, finalmente, em relação ao estilo de vida, ainda continuamos a usar lenha para cozinhar, ainda não temos acesso a infraestruturas sanitárias básicas, entre outras deficiências. Se forem diminuídos os valores que dizem respeito a estes 10 indicadores, poderíamos reduzir a pobreza multidimensional e os seus efeitos na má nutrição.

Dados mostram que 47% das crianças com menos de cinco anos sofrem de desnutrição e 8,6% de raquitismo. Para baixar estes valores, o que é que o Governo precisa de fazer?

Atualmente Timor-Leste regista cerca de 47% de casos de nanismo. Com esta percentagem, segundo padrões de saúde pública da Organização Mundial de Saúde (OMS), o país está a um passo de entrar naquilo que se chama de ‘linha vermelha’ e não queremos isso. Então, precisamos de investir mais em programas ligados ao combate ao nanismo. Primeiro, temos de melhorar a qualidade da saúde. Segundo, alimentar as crianças de forma nutritiva.

Na sua opinião, o que é que se pode fazer para assegurar a sustentabilidade na produção de alimentos saudáveis?

É preciso pôr em ação o plano integrado até 2030. Se não tivermos alguma  consistência na implementação dos programas prioritários, haverá problemas. Temos de investir mais, porque atualmente o nosso investimento não apresenta um retorno positivo: o nanismo teve apenas uma redução de 10% nos últimos anos, o que reflete um avanço muito lento. Queremos  progressos mais rápidos e evidentes até porque o nosso plano estratégico relaciona-se intimamente com um objetivo de desenvolvimento sustentável que estipula que, até 2030, temos de reduzir para metade as atuais percentagens de nanismo. Para isso é necessário um investimento sério. Para além disso, temos de avaliar continuamente os resultados para sabermos se há, de facto, um progresso. Se conseguirmos implementar adequadamente o nosso plano durante sete anos, creio que conseguiremos atingir as nossas metas.

“Gostaria de recomendar aos órgãos competentes que priorizem o povo, investindo na alimentação e na saúde”

O que é que Timor-Leste precisa de fazer para garantir a segurança alimentar?

Para já penso que deverá implementar adequadamente o plano traçado, tendo em conta resultados obtidos a partir de um estudo que se fez junto de comunidades representativas do problema. Temos de investir bem, isto é, é preciso que se garanta um orçamento suficiente e que este seja executado com seriedade.

O que sugere ao Governo para que este garanta um orçamento adequado para os programas de combate à má nutrição e ao nanismo?

A nova política do Governo dita que a alocação de verbas seja feita a programas e não a instituições. Por isso, os técnicos devem desenhar planos de intervenção altamente orientados  para que, no processo de implementação, o orçamento seja eficientemente gasto. Precisamos de verbas para a merenda escolar, para a alimentação dos bebés e crianças até aos cinco anos de idade e também das suas mães, bem como prever um montante para a produção e investimento na produtividade alimentar e em infraestruturas que garantam a circulação fácil dos alimentos. Os investimentos nestes setores não podem falhar porque temos agora apenas sete anos para resolver a questão.

Gostaria de deixar alguma mensagem para o Executivo e para a população sobre a prevenção da má nutrição no país?

Para o IX Governo gostaria de recomendar aos órgãos competentes que priorizem o povo, investindo na alimentação e na saúde. E para o povo timorense, gostaria de dizer que a melhor forma de ajudar o Estado é cuidando da sua própria dieta alimentar e saúde.

Notícia relacionada: Filipe da Costa: papel dos jovens é fundamental na luta contra má nutrição e nanismo infantil

Equipa da TATOLI

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