DÍLI, 20 de maio de 2023 (TATOLI) – Consolidar a Democracia para Melhorar a Qualidade de Vida dos Povos é o tema do 21.º aniversário da Restauração da Independência de Timor-Leste. Se tivermos em conta a natureza dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para 2030, priorizadas que foram as áreas da educação, da saúde, da melhoria de infraestruturas e de uma economia sustentável, o país ainda se encontra num estado inicial de desenvolvimento.
Os avanços: educação, saúde e infraestruturas
Desde a restauração da democracia, o país fez progressos em vários setores. Por exemplo, no setor da educação. Em 2016, o Governo construiu e reabilitou 1.715 escolas do ensino básico e secundário, em comparação com as 943 escolas que existiam no início da independência. Registou ainda a criação de 12 instituições de ensino superior.
Na saúde, mais especificamente na luta contra a malária, Timor-Leste foi reconhecido como um país livre daquela patologia pela Organização Mundial de Saúde, em 2018, o que foi considerado um sucesso. As autoridades de saúde continuam a lutar contra eventuais surtos e, até à data, não têm sido registados, ou ocorridos casos residuais.
Detendo-nos nas infraestruturas, merece relevo o Porto de Tíbar, criado para melhorar a conetividade marítima na região da Ásia-Pacífico, principalmente para trocas comerciais. É um investimento estatal passível de gerar receitas a curto prazo. Sendo a estrutura portuária resultado de uma parceira público-privada, os termos contratuais estipulam que a administração do porto fique sob a alçada do consórcio Bolloré por 30 anos.

No que respeita à cobertura elétrica, em 2020, a respetiva rede chegou a 86% do território nacional. De acordo com o Comissário Executivo dos Serviços Técnicos e membro do Conselho de Administração da Companhia de Eletricidade de Timor-Leste, Latino Jerónimo, na atualidade, a cobertura elétrica atingiu um valor superior a 90% do território.
Em relação à democracia no país, destacam-se as eleições livres, que têm respeitado a vontade popular. Prevalece também no país um clima de paz, ainda que alguns episódios de violência, envolvendo sobretudo jovens, ocorram pontualmente.
A estagnação: saneamento, formação de professores, ambiente e emprego
Contudo, questões essenciais como o saneamento, incluindo o acesso à água potável, um sistema de saúde que atenda a população com dignidade, escolas com professores qualificados e boas infraestruturas, políticas de consciencialização ambiental, estratégias para diversificar a economia, gerar emprego e reajustar o salário mínimo são aspetos que ainda necessitam de maior atenção por parte dos governantes e lideranças.
Dependência do petróleo e pouca qualificação dos recursos humanos

Celestino Gusmão, Diretor da La’o Hamutuk, uma organização não-governamental que desde 2020 analisa e acompanha o desenvolvimento de Timor-Leste, disse que este ainda está muito dependente do setor petrolífero, argumentando que “o país não está seriamente focado no desenvolvimento dos recursos humanos. Apesar de ter recursos, o Governo ainda enfrenta dificuldades em criar empregos”.
Um relatório do Banco Mundial de 2020 mostra que Timor-Leste é considerado um país de rendimento “médio inferior”, e que apresentava, em 2017, um Produto Interno Bruto (PIB) não petrolífero per capita de 1.618 dólares americanos.
Outra fonte, um relatório do Fundo Monetário Internacional (FMI) de 2017, sustenta que o crescimento económico é largamente alimentado pelo setor petrolífero, que representa aproximadamente 61% do PIB. Paralelamente, o setor não petrolífero e a economia dele derivado têm crescido anualmente cerca de 10% desde 2006, em grande parte apoiados pelo Estado.
Considerados estes dados, o diretor da La’o Hamutuk avalia a economia timorense como demasiadamente alicerçada nas receitas do petróleo e, mesmo havendo programas para fomentar o desenvolvimento fora daquele setor, ressalta haver um “congelamento de programas”, motivado “por uma explícita incapacidade de execução” pelas partes envolvidas.
Como efeito desta “política inconsciente”, os cidadãos vivenciam uma situação de dependência contínua face ao Estado (por exemplo, na obtenção de emprego), algo que, para Celestino Gusmão, deve ser combatido. Qualquer iniciativa, no ver do dirigente, implica que o governo reorganize os cidadãos para que tenham uma mentalidade compatível com um espírito de independência económica e não a submissão a um estado de subsidiodependência.
De acordo com relatório Timor-Leste:2021 Economic Survey, divulgado pela La’o Hamutuk, em 2021, o desemprego atinge 27% da população do país.
Na opinião de Custódio Ximenes, Decano da Faculdade de Economia e Gestão da Universidade Nacional Timor Lorosa’e (UNTL), “a incapacidade de execução” de atividades mencionada por Celestino Gusmão está relacionada com a falta de políticas de qualificação dos recursos humanos timorenses. “Nos países desenvolvidos, os governantes e lideranças procuram utilizar os seus recursos humanos da melhor forma possível, para que possam melhorar o seu desempenho e produtividade. Em Timor-Leste, não é o que ocorre. Por aqui, os recursos humanos estão a ser desperdiçados”, afirmou.
O decano também é a favor de que o Governo implemente uma política de descentralização, para que os municípios sejam incluídos numa lógica de desenvolvimento e aproveitamento de potencialidades.
“Vemos as pessoas nos municípios a pensar que não têm possibilidades de rendimento, mas, na realidade, nós temos tudo. Temos terras férteis e vastas, podemos cultivar diferentes tipos de culturas, fazer aquacultura, etc. Tudo isto exige conhecimento e organização dos serviços por parte das autoridades”, refletiu.
Custódio Ximenes acrescentou ainda que uma das possíveis soluções para o desenvolvimento económico e para a criação de emprego (fora da esfera estatal) é convidar empresas estrangeiras a investir no país. Para o reitor, em Timor-Leste, durante 21 anos de independência, o desenvolvimento nacional tem progredido, mas a um ritmo lento.
O diretor da La’o Hamutuk, por sua vez, destacou que um dos desafios dos governantes e lideranças timorenses está em encontrar um equilíbrio na utilização de recursos e políticas públicas, para que tanto investimentos em grandes infraestruturas como em necessidades básicas não fiquem prejudicadas.
“É um dilema, por um lado, o Governo ter de investir em portos marítimos, no setor elétrico e na construção e melhorias de estradas por todo o país mas, por outro, o povo não pode ficar sem água e saneamento básico, e sem um sistema de saúde que funcione”.
Educação, agricultura e turismo são fundamentais para o desenvolvimento
Entre 2015 e 2022, a população de Timor-Leste cresceu 13,4%, passando de 1,18 milhões de habitantes para 1,38 milhões.
O líder da La’o Hamutuk salienta que a educação está num estado deficiente. Para Celestino Gusmão, o conceito de educação de qualidade consiste em professores qualificados, infraestruturas adequadas, constituídas por laboratórios e bibliotecas. “Com o aumento da população, as escolas não são suficientes para acomodar o número de alunos, principalmente em escolas públicas das maiores cidades, e isto pode, evidentemente, afetar a qualidade cognitiva dos estudantes”.
O baixo investimento na educação reflete-se na qualidade do ensino em Timor-Leste. A maioria das escolas não tem boas condições, nem recursos materiais e humanos adequados. Os baixos salários, o número insuficiente de professores (muitos deles com falta de formação), turmas numerosas e infraestruturas precárias, são sinais de que o orçamento para a educação não é suficiente para garantir um sistema de ensino-aprendizagem digno no país.
Cristóvão Renato, 23 anos, estudante de Direito na UNTL e ativista de um programa de defesa dos direitos das meninas na organização Aliansa Labarik Feto, acentuou que, a seu ver, uma educação de qualidade é importante para o desenvolvimento de competências pessoais. O jovem acredita que quando as pessoas são formadas e informadas, têm a confiança necessária para criar os seus próprios empregos.
O ativista vai mais longe: tem como ponto fundamental que as autoridades combatam a corrupção e o nepotismo, como passo relevante para resolver problemas sociais, como a desigualdade no tratamento entre diferentes pessoas.
Sustentou, finalmente, que a educação, a agricultura e o turismo são as chaves do desenvolvimento para o país, considerando que o grande problema de Timor-Leste é a falta de emprego e “seriedade por parte dos governantes”.
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Equipa da TATOLI