DÍLI, 18 de agosto de 2023 (TATOLI) – “O meu país tem uma literatura oral extraordinária” foi a frase de Luís Cardoso de Noronha ‘Takas’ que mais ecoou na cerimónia em que o escritor timorense foi condecorado pelo Presidente da República, José Ramos Horta, com o colar da Ordem de Timor-Leste, grau de Medalha de Honra, como forma de reconhecimento pela sua obra literária, bem como pelo papel que assumiu na luta de libertação do país.
Na cerimónia de condecoração, o Chefe de Estado destacou a importância do regresso de Luís Cardoso a Timor-Leste: “Obrigado por ter aceitado o convite e ter regressado à nossa pátria, depois de anos de exílio em Lisboa, Portugal. Takas, deixa-nos orgulhosos, porque leva o nome de Timor-Leste ao mundo através da sua literatura. Espero que inspire as novas gerações a se tornarem escritores no futuro”.
No discurso de agradecimento, Luís Cardoso referiu que encara este prémio como uma homenagem aos seus pais, à sua esposa e filha e os seus professores de Ataúro, de Soibada e de Fuiloro. “Um prémio de literário é aquilo que acontece na vida de um escritor quando acredita no valor e na qualidade do seu trabalho. Uma condecoração é aquilo que o Estado concede aos seus cidadãos pelos serviços relevantes. Não tenho feito trabalho relevante pelo meu país durante os 20 anos, a não ser prestar o meu contributo para a existência de uma literatura timorense”, afirmou Luís Cardoso.
O vencedor do Prémio Oceanos de 2021 acredita que a literatura timorense se poderá desenvolver. “Juntos engrandecemos a literatura do nosso país. O meu país tem um povo extraordinário, tem uma história extraordinária, uma liderança extraordinária que conduziu o povo à independência, tem uma literatura oral extraordinária. Acredito que mais cedo ou mais tarde teremos também escritores extraordinários em Timor-Leste”.
Luís Cardoso nasceu em Cailaco, no município de Bobonaro. É filho de um enfermeiro que prestou serviço em várias localidades de Timor-Leste, razão pela qual conhece e fala diferentes idiomas timorenses. Estudou nos colégios missionários de Soibada e de Fuiloro, no seminário dos Jesuítas em Dare e no Liceu Dr. Francisco Machado, em Díli.
Licenciou-se em Silvicultura no Instituto Superior de Agronomia de Lisboa e desempenhou funções como representante do Conselho Nacional da Resistência Maubere em Portugal. Da sua bibliografia contam-se obras como a Crónica de Uma Travessia (1997); Olhos de Coruja; Olhos de Gato Bravo (2002), A Última Morte do Coronel Santiago (2003), Requiem para o Navegador Solitário (2007); O ano em que Pigafetta completou a circum-navegação (2013); Para onde vão os gatos quando morrem? (2017) e O Plantador de Abóboras (2021).
O autor, que prefere ser reconhecido como um “amante da palavra escrita e um bom leitor”, tem um registo prolífico, pormenorizado e, amiúde, biográfico na sua obra. A sua escrita está repleta de elementos etnobiográficos de Timor-Leste, do tempo da sua infância, ora transformados em aventuras realistas do olhar de uma criança, ora romantizadas a posteriori sob a lupa da memória de um adulto com saudades. Em ambas, perceções e metaperceções de si e de terceiros jogam num diálogo frutífero. Nas descrições, por sua vez, chama o leitor para os sentidos: para o cheiro do pão fresco, para a macieza das peles e para o espetáculo de luz dos céus de Timor e das suas montanhas. Quase toda a sua obra espelha uma memória imagética de uma criança e de um jovem que não quer que memórias visuais, tácteis e olfativas se apaguem dos anais da história. A sua ficção cumpre este propósito: perpetua vontades, singularidades de personagens, locais e aspetos sensoriais que mostram um Timor-Leste mais romântico, calmo e soalheiro.
Jornalista: Afonso do Rosário
Editora: Isaura Lemos de Deus