DÍLI, 01 agosto de 2023 – (TATOLI) – A falta de espaço nos dois mercados municipais de Díli continua a levar os vendedores a negociar em locais públicos sem condições para o efeito, seja nas bermas das estradas ou nos passeios, em jardins, ou perto das praias. Comerciantes que instalaram os seus pontos de venda em locais como o Largo de Lecidere, ou outras zonas movimentadas da cidade, reclamam o direito aos seus negócios e acusam as autoridades de os expulsarem sem apresentar soluções. Os vendedores vêm-se ‘obrigados’ a deambular por vários pontos da cidade, o que gera desorganização, trânsito e lixo por toda a capital.
“Reconhecemos que Díli é uma cidade que ainda não está bem organizada, mas, para solucionar esta questão, temos de instalar um novo mercado que possa concentrar os vendedores e reduzir o número das pessoas que estabelecem os seus negócios nos espaços públicos”, defende o Diretor do Serviço Municipal de Gestão de Mercado e Turismo, Artur Henriques, sublinhando que apenas dois mercados, Taibessi e Manleuna, não são suficientes para albergar todos os comerciantes da capital.
O diretor acrescenta ainda que as pessoas que vendem nas ruas são, maioritariamente, dos municípios, alertando também para a necessidade de criar mais mercados a nível nacional. “Normalmente, os residentes de Díli não ocupam os locais proibidos. Vendem, junto das suas casas, bens de primeira necessidade. Os que vendem nas ruas são oriundos de outros municípios, o que ajuda a tornar a capital ainda mais desorganizada. Nestes casos, é muito difícil controlar. Mesmo que se tomem medidas para confiscar os seus produtos, no dia seguinte voltarão a fazer o mesmo”.

Apesar disso, reconhece que também o mercado de Taibessi é “muito desorganizado”, uma vez que as pessoas para além de venderem no local, também vivem ali. Ao contrário do espaço de Manleuana, que considera ser mais organizado porque normalmente encerra às 17h o que não permite que os comerciantes lá vivam.
Mas, por outro lado, uma vez que encerra mais cedo, alguns destes vendedores continuam os seus negócios, entre as 17h30 e as 22h00, em zonas movimentadas da cidade como Comoro, Elemloi, Fatuhada, Bairro Pité e Foho Osan Mean. Esta aglomeração de vendedores causa congestionamentos constantes no trânsito e chega a gerar um cenário de caos para todos quantos circulam por estas vias.
“Temos de tomar medidas para impedir que as pessoas continuem a ocupar os espaços públicos e as áreas turísticas”
Outras áreas turísticas, como Tasi-Tolu, o Largo de Lecidere e Bidau Santa Ana, são também regularmente ocupadas pelos vendedores. Relativamente a estas zonas, Artur Henriques, destaca o Largo de Lecidere e a zona de Bidau Santa Ana, nomeadamente junto a zona junto ao jardim BJ Habibie, como locais particularmente desordenados. Aqui, para além de venderem, as pessoas constroem barracas com sucata e antigo zinco e jogam ‘bola guling’ (jogo tradicional indonésio) e bilhar. Mais grave ainda, “também há atividades de prostituição”.
“A meu ver, Díli transformou-se numa lixeira. Temos de tomar medidas para impedir as pessoas de continuarem a ocupar os espaços públicos e as áreas turísticas”, destaca o responsável.
Questionados sobre a aglomeração de resíduos nestas zonas, os vendedores garantem não ser os responsáveis por essa situação e apontam o dedo à comunidade, por não mostrar preocupação em salvaguardar a limpeza destes locais e por deitar o lixo nos jardins ou outras zonas públicas.
Relativamente a estas atitudes, Artur Henriques alerta que “os vendedores têm também a obrigação de controlar a população e avisar que não podem deitar o lixo para o chão, aleatoriamente”.
A luta dos vendedores
Um dos vendedores ambulantes no Largo de Lecidere, José Ricardo, reclama o seu direito, enquanto timorense, a um espaço para poder ter o seu negócio. “Somos timorenses, quando as autoridades nos expulsarem, para onde é que iremos? Já prepararam algum sítio para nós? E será que o novo local terá tantos clientes como temos no Largo de Lecidere?”, perguntou indignado.
Questionado sobre a razão pela qual muitos vendedores pernoitam nos jardins em Lecidere, José Ricardo explica que aqueles são obrigados a ficar lá para vigiar os seus bens.
“As mulheres podem voltar para casa, mas os homens têm de ficar e dormir cá, porque somos muitas vezes roubados e ninguém se responsabiliza. Será que o Governo se quer responsabilizar?”, questiona.
José Ricardo garante que os vendedores podem deixar de pernoitar no local, caso as entidades competentes destaquem pessoal de segurança para vigiar o jardim durante a noite.
Por outro lado, o vendedor explica que escolheu este espaço porque a praia é um dos locais mais frequentados da capital. “As pessoas estão sempre a fazer exercício na praia, por isso quando as têm muito calor ou sede vão comprar cocos. Se vendêssemos em Caicoli, seria difícil as pessoas comprarem”, afirma.
Recorde-se que a Autoridade Municipal de Díli (AMD) deu um prazo para os vendedores do Largo de Lecidere abandonarem o local até quarta-feira, dia 2 de agosto.
“É com o rendimento do nosso negócio que podemos suportar os estudos dos nossos filhos e sustentar as necessidades da família”
Já a vendedora Felizarda dos Santos conta que, alegadamente, ainda este ano, a AMD e a Polícia Nacional de Timor-Leste (PNTL) decidiram mudar os vendedores da zona de Comoro para uma zona perto da rotunda de Nicolau Lobato.
“A AMD e a PNTL permitiram-nos vender nessa zona, mas não nos deram licença para instalar tendas. Por isso, compramos zinco e ferro no valor de mais de 250 dólares americanos para construir novos quiosques, no entanto, em menos de um mês, destruíram tudo o que tínhamos”, denuncia a vendedora com um semblante carregado. De acordo com a vendedora, “as autoridades prometeram indemnizar a destruição que causaram, o que até agora ainda não aconteceu”.
“Queremos ficar livres para vender os nossos legumes, não queremos ser perseguidos de um lado para outro. Não somos empregados que recebem dinheiro todos os meses e, pior ainda, temos de pagar o crédito que pedimos ao banco para iniciar este negócio. É com o rendimento do nosso negócio que podemos sustentar os estudos dos nossos filhos e suportar as necessidades da família”, realça.
Simão Soares, vendedor de frutas em Delta, refere que já comercializa, naquele local, há muito tempo, mas ele e os colegas estão sempre a ser vigiados pela polícia, que os proíbe de vender a partir das 17h.
“Compreendemos que a estrada é para os carros passarem, mas temos de vender aqui, mesmo que isso ponha a nossa vida em risco”, defende o vendedor.
Também Simão Soares paga os estudos dos filhos e dos sobrinhos com o dinheiro que ganha nesta atividade. Pede, por isso, ao Governo para abrir um mercado, onde todas as pessoas possam vender os seus produtos, até qualquer hora.
Apesar de todas as dificuldades, os vendedores não desistem de insistir na criação de mais mercados municipais, que permitam um comércio mais organizado. Deixar de vender seria abdicar da única fonte de rendimento das famílias e essa não pode ser a solução.
Equipa da TATOLI